CLAUDIO J. D. SALES E RICHARD LEE HOCHSTETLER
Terceirizar para melhorar
O ministro Joaquim Levy (Fazenda) causou alvoroço no final do ano passado ao afirmar, antes mesmo de ser empossado, que a aprovação do projeto de lei nº 4.330/2004 -que propõe a regulação de serviço a terceiros e que está em tramitação no Congresso Nacional- aceleraria a formalização da força de trabalho.
A afirmação parece anti-intuitiva porque um dos argumentos mais frequentemente usados contra a terceirização é o de que ela ocasionaria a precarização das relações trabalhistas. Mas há bons motivos para crer que o ministro tem razão.
Se a matéria for aprovada, a insegurança jurídica sobre o tema será eliminada. Atualmente, o TST (Tribunal Superior do Trabalho) admite apenas a terceirização de atividades-meio e proíbe a terceirização das atividades-fim. Trata-se de uma definição fluida e difícil de ser estabelecida.
Esse conceito nebuloso tem resultado em milhares de processos que abarrotam os tribunais e geram despesas milionárias em honorários advocatícios. Além disso, essa incerteza inibe investimentos, impedindo que as empresas e seus trabalhadores alcancem seus plenos potenciais, o que acaba resultando em menor eficiência.
Em suma, a incerteza provocada pela ambígua delimitação do que pode ou não ser terceirizado coloca as empresas em situação dúbia -o que acaba levando à precarização do planejamento de suas operações, com ênfase nas operações intensivas em mão de obra. A eliminação dessa incerteza pode contribuir significativamente para a melhoria das condições de trabalho.
A análise sobre terceirização não pode apenas se limitar aos efeitos sobre os trabalhadores das empresas diretamente afetadas. A análise deve ser ampliada para avaliar os impactos sobre consumidores, trabalhadores de outras empresas, e trabalhadores desempregados que poderiam ter oportunidades abertas pela terceirização.
Tal ampliação é essencial porque evidencia um dos principais benefícios da terceirização: o acirramento da concorrência dos processos produtivos atualmente internalizados nas empresas.
Essa concorrência tende a elevar a eficiência, reduzindo os preços para os consumidores, aumentando a produção e, como consequência, abrindo novas vagas. A pressão competitiva da terceirização também facilita o ingresso de novos trabalhadores na prestação de determinados serviços, o que pode reduzir o nível de desemprego.
Como aponta o estudo “White Paper nº 8 – Terceirização no Setor Elétrico e o Interesse Público”, produzido pelo Instituto Acende Brasil, a terceirização não se resume à subcontratação de trabalhadores. A terceirização é uma reorganização do processo produtivo para aperfeiçoar o desempenho das empresas.
Por isso faz sentido que o Supremo Tribunal Federal esteja examinando a questão da constitucionalidade de se privar as empresas de exercer seu “direito fundamental de livre iniciativa” para “organizar sua atividade empresarial de forma lícita e da maneira que entenda ser mais eficiente” no recurso extraordinário com agravo da Cenibra (Celulose Nipo-Brasileira S.A.).
As políticas públicas sobre a terceirização precisam ser estabelecidas tendo em vista o interesse público, e não apenas os interesses corporativos de sindicatos que se beneficiam das restrições colocadas sobre a terceirização.
O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, enriquece o debate público ao apontar os benefícios difusos associados à terceirização, que têm sido negligenciados pelas autoridades por tanto tempo.
CLAUDIO J. D. SALES, 67, é engenheiro e presidente do Instituto Acende Brasil, centro de estudos voltado ao setor elétrico
RICHARD LEE HOCHSTETLER, 46, é economista do Instituto Acende Brasil
–
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br
Fonte: Folha de S.Paulo